quarta-feira, maio 09, 2007

O PNSE na Kaminhos

O outro artigo publicado hoje pela Kaminhos sobre a questão dos fogareiros do Covão d'Ametade foi baseado em declarações do Engº Fernando Matos, Director do PNSE. Pode lê-lo aqui.

Imagino que esteja também afectado de pequenas imprecisões ou pode acontecer que não, que por Fernando Matos estar mais habituado do que eu a lidar com a imprensa, se consiga fazer entender melhor. Seja como for, o que aparece na notícia (corresponda fielmente ou não às opiniões de Fernando Matos sobre este assunto) merece-me os comentários que se seguem.

  • Os novos fogareiros não vão minimizar (ou seja, tornar mínimo) o risco de incêndios. Podemos discutir se esse risco é maior ou menor do que com os pequenos e toscos grelhadores que já lá existiam, mas é óbvio que o risco se minimiza aplicando a lei que proíbe fazer fogos em áreas de floresta durante o Verão. Ou seja, se é para minimizar o risco de fogos, não se devem, pura e simplesmente, fazer grelhados ao ar livre no Covão d'Ametade durante o Verão, seja em que condições for. Ora, é no Verão que apetece lá fazer grelhados. Para que servirão, então, os grelhadores?
    Dito isto, quero ainda argumentar que estas novas estruturas não só não minimizam o risco de incêndio, como o tornam maior do que o associado aos antigos grelhadores. A variável relevante para avaliar o risco de incêndio não é o risco por grelhador (que admito seja menor agora) a que se refere Fernando Matos, mas sim o risco por grelhado, multiplicado pelo número de grelhados efectivamente realizados. Ora, estas novas estruturas permitem mais fogos em simultâneo, tornam o grelhar mais confortável (o "chef" não é obrigado a agachar-se para controlar o grelhado) e, por serem mais visíveis, lembrarão a mais visitantes a possibilidade da feitura de grelhados. Penso que porque se instalaram estes grelhadores, haverá mais grelhados no Covão d'Ametade. Encorajámos deste modo a realização de grelhados, logo, aumentámos o risco da ocorrência de incêndios, porque contribuímos para aumentar o número de fogueiras ao ar livre feitas no Covão d'Ametade.
  • Não compreendo de que maneira "estamos a dar mais qualidade e segurança ao local". A qualidade do lugar resulta da sua beleza e tranquilidade. Os grelhadores, mesmo sem entrarmos em valorações estéticas, constituem elementos marcadamente estranhos ao local, que se impõem pelas suas dimensões e linhas geométricas. Achemo-los bonitos ou feios, contrastam vincadamente com os elementos que fazem a maravilha que é o Covão. É portanto, como aliás reconhece Fernando Matos, muito discutível o seu enquadramento. Discutamo-lo, portanto. Ah, já não vale a pena, a obra já está em curso, já não há tempo para discutir, avaliar opções, escolher seja o que for. Ou seja, apesar de se considerar o enquadramento destas estruturas discutível, optou-se por não o discutir.
  • Sobre a destruição do cervunal que afinal não existe no Covão d'Ametade, já disse o que tenho a dizer no post anterior. Seja como for, quando lemos opiniões de especialistas segundo os quais a Serra da Estrela esteve em tempos quase totalmente coberta por floresta, incluindo carvalhos, bétulas e tramazeiras, e que só a acção humana da pastorícia e agricultura lhe deu o aspecto despido que tem hoje, perguntamo-nos qual o significado da expressão "habitat natural" na Serra da Estrela. Pensava que era ponto assente que praticamente não existem habitats verdadeiramente naturais na Serra da Estrela. Isso significa que não vale a pena conservar os que existem? Não acredito que seja essa a posição do Director do Parque Natural da Serra da Estrela.
  • Este empreendimento não é, pelo que pude perceber quando contactei o PNSE e agora após ler a notícia da Kaminhos, uma iniciativa do PNSE, mas sim da Associação de Compartes de Baldios da freguesia de S. Pedro (Manteigas). É óbvio (será? Já nem digo nada) que esta Associação pediu e teve autorização do PNSE para realizar as obras. Mas a autorização dada, responsabilizando o PNSE, não isenta de responsabilidades ainda maiores os promotores da obra. Não percebo porque é que é o PNSE a fazer a sua defesa, e a fazê-lo nos termos em que o faz, afirmando que "as críticas não têm qualquer fundamento". Têm fundamento, sim senhor, e os que as fazem têm-no apresentado, desde o início desta história.
  • «Estamos a cumprir as regras para os parques de lazer», afirma Fernando Matos. Muito bem. E quando (admitamos hipoteticamente) a Associação de Compartes de Baldios da freguesia de S. Pedro (Manteigas) pretender, ao abrigo dessas mesmas regras, instalar um campo de futebol de cinco, um ringue de patinagem, uma piscina ou um parque infantil com escorregas e baloiços? O PNSE será, também, favorável, considerará o seu Director que se está, também, a dar mais qualidade ao local?
Mais uma vez, volto a dizer que simpatizo com o PNSE. Apesar de atitudes como esta que aqui comento, considero que o papel do PNSE tem sido fundamental em diversas ocasiões. Se não fosse o PNSE, a situação ambiental da Serra da Estrela seria hoje bem pior, parece-me. Mais ainda, acho que o PNSE é credor de uma dívida de gratidão por parte da Região de Turismo e dos operadores turísticos regionais, pelo até agora único esforço sério e consequente de desenvolvimento do turismo de natureza, com a elaboração e documentação da rede de percursos de grande rota da Serra da Estrela. Essa dívida nunca é reconhecida por parte dos devedores. Antes pelo contrário, vemo-los gritar que o que chamam desenvolvimento do turismo na Serra da Estrela está refém de técnicos do Parque que pretendem tão só ver aplicada a lei das avaliações ambientais para empreendimentos em áreas protegidas(1), ou exigir que os projectos em curso não esbarrem em impedimentos ambientais(2)! Voltando aos fogareiros, espanta-me ver o director do Parque reagir deste modo aos que, defendendo uma maior protecção da natureza, criticam intervenções massificadoras e "suburbiantes" como esta e tão pouco dizer (publicamente, pelo menos) sobre os que o acusam de pretender cumprir uma sua função principal: a de proteger o ambiente da Serra da Estrela.

(1) Refiro-me a afirmações de Artur Costa Pais (administrador da Turistrela) que comentei aqui e de Jorge Patrão (presidente da Região de Turismo) que comentei aqui.

(2) Ver declarações de Jorge Patrão no Público Edição Centro de 31 de Março de 2006, pág 60, que comentei aqui, aqui, aqui e aqui.

1 comentário:

Anónimo disse...

Churrasqueiras para prevenir incêndios??????

Não quero acreditar que um DIRECTOR de um PARQUE NATURAL tenha dito tamanha barbaridade!
Será para ser levado a sério??

Esperem, eu tenho uma ideia melhor: vamos cortar todas as árvores do Covão... é capaz de ser muito mais eficiente como prevenção!

Paulo Roxo

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!