quarta-feira, março 29, 2006

"Revolução no esqui da Serra da Estrela"

Esta notícia saiu no jornal "O Interior" de 23 de Março de 2006, e foi alvo de uma interessante troca de opiniões no blogue (O grande blogue da Covilhã) Máfia da Cova. Quero agora dissecar a notícia a meu belo prazer, com o meu bisturi, por assim dizer.
Vejamos, a Turistrela quer ampliar a estância de esqui. Já disse aqui que não acho isso muito grave, desde que se fiquem pela encosta onde a estância está actualmente situada. Mas que razões ao certo aponta para a necessidade da ampliação? Ficamos a saber com este excerto:
Nesse sentido, a Turistrela terá já adquirido seis novos teleskis, três dos quais com capacidade para transportar mil pessoas e os restantes para 800 pessoas. Investimentos necessários para eliminar as filas que já se verificavam no teleski e na telecadeira.
Ou seja, Artur Costa Pais, o administrador da Turistrela, pretende fazer-nos crer que aumentando a capacidade da estância (medida pelo número de esquiadores que por hora podem utilizar os meios mecânicos para a subida) se reduzem as bichas de espera nos teleskis e telecadeiras. Mmmm, não sei. A estância da Turistrela tem actualmente uma capacidade de 3700 esquiadores por hora. Juntando os novos teleskis (3x1000+3x800=5400), ficará com uma capacidade de 9100 esquiadores por hora. Será suficiente? Vejamos, vou buscar números aos sites das estâncias onde já estive:
  • La Covatilla, Béjar, Estremadura (Espanha)
    Capacidade: 3214 esq./hora
    Bichas: Sim
  • Formigal, Aragão (Espanha)
    Capacidade: 34000 esq./hora
    Bichas: Sim, grandes
  • Pas de La Casa/Grau Roig, Andorra
    Capacidade: 46000 esq./hora
    Bichas: Sim, enormes
  • Baqueira/Beret, Catalunha, (Espanha)
    Capacidade: 49300 esq./hora
    Bichas: é melhor nem falar, até para o xixi (o dos homens!)...
  • Serra da Estrela, Portugal
    Capacidade (actual): 3700 esq./hora
    Bichas: só aos fins de semana; durante a semana é esquiar sem parar.
Não são necessários comentários, pois não? Assim como a abertura de mais estradas não acabará com os engarrafamentos, também a abertura de mais meios mecânicos não acabará com as bichas. Antes pelo contrário, mais pessoas virão esquiar para a Torre e maiores serão as bichas. Além disso, onde é que estas pessoas deixarão os seus carros? Em maiores parques de estacionamento? Ah!, já me esquecia, vão-se construir as telecabines! Os esquiadores poderão deixar os carros no Covão do Ferro e no extremo oriental da Lagoa Comprida, locais ainda não conspurcados por esta demência poluente, que serão requalificados como parques de estacionamento! Como Costa Pais não acredita mais do que eu que esta ampliação resolva o "problema" das bichas nos teleskis (grande problema; comparado com a lixeira em que transformámos a zona da Torre...), refere imediatamente a seguir na mesma notícia, que
Com estes equipamentos, resolveremos os problemas durante os próximos dois ou três anos,
após os quais, está-se já a ver, serão necessários mais uns teleskis, umas telecabines, uns parques de estacionamento... E quem é que paga? A Turistrela? Não sei... Suspeito que serão os programas públicos PENT e PETIR. Ah, vivam as forças vivas regionais!
O que mais me entristece nesta notícia não é a intenção da Turistrela. Como já disse, a turistrela não é um organismo governamental de desenvolvimento, não é uma ONG, não é uma reunião de caridade; trata-se, antes, de uma empresa que, como todas, visa maximizar o seu lucro, coisa que passa (parece-me que indirectamente, apenas) pelo esqui. O que verdadeiramente me deprime, é ver que esta empresa converteu à defesa dos seus objectivos autarquias e agências de desenvolvimento públicas ou semi-públicas, que foram criadas para defender outros interesses.

8 comentários:

Anónimo disse...

Boa tarde ! Como não poderia deixar de ser , aqui estou a retribuir as visitas .Vinha por aqui algumas vezes , que se tornaram mais regulares após a nossa troca de correspondencia lá pelo blog da Máfia da Cova . Pela minha parte tenho participado e divulgado exausitivamente o "Máfia " , claro q após conhecer melhor este seu trabalho , conte comigo para a participação por aqui , bem como para a respectiva divulgação .
Um abraço do amigo Big Brother .

ljma disse...

Obrigado, BB! Como se vê de longe, o meu blog tem objectivos concretos, que não pretendo esconder, claramente contra as actuais intenções dos poderes que gerem a Serra. Espero contribuir para convencer esses poderes a mudarem de rumo. Parece-me (mas posso estar enganado) que a protecção da Serra, como eu a entendo, será tanto mais fácil quanto mais gente discutir os assuntos que trago ao Cântaro. O seu apoio a esta causa (refiro-me à de fazer as pessoas discutir, mesmo que não estejam de acordo comigo) é um de peso! Um abraço também, e longa vida à Máfia!
[O FBI, com os seus supercomputadores e equipas de tradutores, sociólogos, antropólogos, filósofos, linguistas e eu sei lá que mais, estarão não tarda nada a tentar decifrar segundos ou terceiros sentidos neste comentário, só à conta desta saudação! eheheh!]

Anónimo disse...

Como não podia deixar de fazer, depois do dialogo que tivemos no Mafia da Cova, também aqui venho ajudar a demonstrar a quem "pode e manda", que ainda há quem se preocupe pela Serra e não somente com ideias e lucros a curto prazo!

Só uma perguntinha... A Turistrela tem a concessão do turismo na Serra da Estrela até quando? Existe algum tipo de acordo com um prazo para renegociação ou é por tempo indetermidado?

ljma disse...

Viva, fixer, obrigado também pela forcinha!
Não sei responder às suas perguntas. Sei que a concessão é por uma porradona de anos. No ano passado, alguns empresários (ou terá sido só um, não sei) tentaram convencer o governo a por fim à concessão da Turistrela. O que mais se evidenciou foi Luís Veiga (melhor dito, Luís Veiga foi o único que notei neste movimento), do grupo IMB (da Covilhã, é o grupo responsável pela reconstrução e futura exploração das termas de Unhais da Serra). Deixou de se ouvir falar nesse assunto, por isso penso que o governo pretende manter a concessão. Mas estou a falar nisto porque Luís Veiga prestou declarações que dão algumas pistas para as respostas às as suas perguntas. Veja, por exemplo, este artigo daquele empresário, segundo o qual a Turistrela foi uma empresa criada pelo estado no tempo da outra senhora (1971), quando ainda imperava a política do acondicionamento industrial, e foi privatizada em 1986. Luís Veiga diz que a concessão é por 60 anos, mas não sei se a contar da data da fundação se da da privatização (seja como for, é uma enormidade, são raras as empresas que sobrevivem tanto tempo!). Uma busca mais apurada na internet ou uma conversa com pessoas mais velhas e mais atentas do que eu deverá ser mais informativa. Se souber de algum pormenor picante, não deixe de mo comunicar.

Posto isto, devo voltar a repetir que, se não me agrada a actuação da Turistrela, também não sei se a liberalização será uma coisa boa. Luís Veiga fala como adversário da Turistrela mas não tenho certezas nenhumas sobre o seu respeito pela Serra. Os inimigos dos inimigos da Serra nem sempre amigos da serra são... Sem querer fazer aqui um julgamento de uma pessoa e uma empresa que não conheço, refiro, mesmo assim, que notei que a reconstrução das termas de Unhais parece ter sido decidida, de certo modo, em parceria com a Câmara da Covilhã: tu fazes-me uma estrada para o maciço central, que eu faço-te um hotel e termas. Assim parece ter começado a asfaltação do caminho entre Unhais da Serra e a Nave de Santo António. Mais tarde foi interrompida a obra (mas há-de recomeçar, podemos estar certos!) porque, conforme diz Lemos Santos (coordenador da Acção Integrada de Base Territorial da Serra da Estrela) no blog do tráfego na Serra da Estrela, certos problemas técnicos e financeiros não puderam ser resolvidos. Está-se a ver que planearam a obra com estudos tão aprofundados como os que foram feitos para a construção do velho teleférico que enfeitou a Nave de Sto António durante 20 anos...

O vale da Alforfa (entre Unhais e a Nave) é um espanto, de cortar a respiração. Asfalta-se por ele acima uma estrada, o que é que resta? Mais um trajecto para as automobilizadas voltinhas dos tristes, a encher-se de montes de entulho dos construtores civis incivilizados e de montinhos de lixo de piqueniqueiros do mesmo calibre... Mas os que se hospedarem no novo hotel de Unhais vão poder ir para a pista de esqui de carrinho, em meia hora, como se estivessem na Covilhã ou em Seia... É a melhor maneira de apreciarem o vale, sem sentirem o vento, a humidade, o cheiro, sem se cansarem... Tal e qual como se o vissem na TV, há lá coisa melhor?

Anónimo disse...

Vou tentar saber mais sobre a concessão da Turistrela. Se descobrir algo, eu direi!

A estrada entre Unhais e a Nave é mesmo uma bela estrada. Já a fiz de carro e de Bicicleta (a subir o que foi obra!). Vistas espectaculares, ambiente calmo e sossegado, quando ainda corria água com fartura no canal, chegavam-se a ver trutas saltar!
A última vez que por lá me meti, foi à cerca de dois anos, comecei a descer da Nave e a certo ponto começou a meter medo, havia enumeras pedras (pedregulhos diga-se) na estraga, grandes buracos no alcatrão, ... a certa altura vi um calhau na berma da estrada, com um grande buraco nesta, quase do tamanho do carro (um mini) que preferi voltar para trás (era de noite e chovia)...
Aquela encosta é muito árida, não tem grande vegetação e a que tem vai sendo consumida pelos incêndios... Assim é difícil conseguir suster as pedras na encosta e basta vir uma grande chuvada para rolar mais um calhau. Desde sempre que lá cairam pedras, mas era uma estrada de terra, com muito pouco movimento e quando aparecia uma pedra no caminho, desviavam-na e continuavam a viagem! Agora numa estrada de alcatrão, em que o movimento vai ser muito, como vão resolver essa questão? Ou será que só vão pensar nisso quando morrer alguem porque um calhau caiu em cima do carro, depois de rebolar num desnivel de mais de 100m!


Luis Veiga, grupo IMB, ... talvez lutasse só pelo mesmo "tacho"!!!

Anónimo disse...

Por falar dessa estrada : é uma aberração !
Sempre gostei de passear por lá quando era em terra macadamizada . Mas o traçado é bonito por sinuoso e pelo prazer de se fazer a pé , sem pressas , a respirar aquele ar puro e a apreciar os odores que andam no ar .
Com automóveis a circular , perde-se todo o encanto...

Anónimo disse...

Vejo com bons olhos a criação de um projecto de mini-estancia de esqui na serra da estrela,digo mini-estancia,pois a estrela jamais poderá ser uma sierra nevada,ou um soldeu de andorra.A serra apresenta limitaçoes quer a nivel de altitude e qualidade da neve pois a serra apresenta uma neve atlantica que cujo a sua caracteristica se caracteriza por ser muito dura,gelo.Um projecto de desportos de inverno na serra da estrela poderia ser um optimo trampolim para trazer um desenvolvimento sustentado a toda região da beira alta e beira baixa,será necessario travar a construção desenfriada na serra,ficando esta somente possivel em cotas baixas,quem quisesse subir a serra só o poderia fazer atraves de telécabines,funicolares,os carros ficariam em parques de estacionamento nas cotas mais baixas (ficando excluido o acesso ás aldeias do interior da serra somente aqueles que lá habitam,seus familiares,autoridades e pouco mais),é necessario reflorestar a serra .Seria interessante fazer sinergias em visitas turisticas á serra da estrela passando sempre pelas rotas do vinho do dão,queijo da serra da estrela,neve, cerejas do fundão na beira baixa entre outros atractivos existentes.Com um pouco de imaginação e seriedade o projecto da serra poderia ser um sucesso!!!!
Não nos podemos esqueçer que a cerca de 100km da fronteira,no lado espanhol,a caminho de cidade rodrigo encontramos um projecto semelhante,a estancia de covatilla,na serra de bejar está muito bem planeada,com optimos acessos,material de esqui em bom estado,parque de estacionamento gratuito numa cota baixa,aldeias historicas recuperadas,bons preços,um forte concorrente ao projecto da nossa serra,deveriamos aprender com eles.

ljma disse...

Caro anónimo, obrigado pela sua contribuição. Como este artigo já está enterrado nos arquivos e, assim, já não tem visibilidade, tomei a liberdade de promover o seu comentário ao estatuto de artigo e explico porque é que não concordo consigo num comentário. Pode reler a sua contribuição e a minha resposta aqui.
Se considerar que eu não devia ter publicado o seu comentário na forma de artigo, diga-me, que eu apago-o e copio para aqui a minha resposta. Mais uma vez, obrigado pela sua opinião.

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!