Desprezo, abandono, esquecimento, são expressões com que no interior frequentemente caracterizamos a atitude do poder central face à fatia do território nacional a mais de 70 km do mar. Quase sempre, estes termos são apropriados (mas não sei se devemos assacar ao governo, ao "poder de Lisboa", todas as responsabilidades pela assimetria litoral/interior que todos os anos se agrava).
Quase sempre são apropriados aqueles termos, mas há excepções. Por exemplo: haverá algum trecho de estrada nacional com cinquenta quilómetros de extensão que mais frequentemente seja objecto de reparações e beneficiações do que a estrada nacional 339 entre Seia e Covilhã? Duvido.
Nos últimos anos têm-se sucedido intervenções: instalação de painéis informativos do estado da estrada, sinalização com altitudes e com avisos de "Check your breaks now", repavimentações, alargamento de zonas de estacionamento... Nos últimos dois ou três anos, tem sido difícil dar um saltinho da Covilhã às Penhas da Saúde sem que nos cruzemos com uma ou mais carrinhas todo o terreno da Estradas de Portugal. Esquecem-se da Serra?! Esquecem-se muito mais de todas as outras estradas do país, parece-me a mim!
Vem isto a propósito de mais uma destas intervenções, agora a decorrer. Temos a EN 339, entre Seia e a zona do antigo sanatório dos ferroviários (cerca de 40 km no total, mais coisa, menos coisa) transformada num estaleiro. O novo tapete, espesso, de bom asfalto, é liso, lisinho, como a pele de uma gueixa japonesa. Um pavimento de auto-estrada. Um pavimento apropriado para corridas de fórmula um. Será, sem dúvida, dos melhores pavimentos de todas as estradas nacionais... Aplicado numa estrada relativamente pouco frequentada. Desprezo, abandono, esquecimento pelo interior? Não neste caso, nem pouco mais ou menos.
Será que serve o turismo esta opção? Não me parece. Em princípio, o turismo é servido com opções que reforcem a especificidade dos locais, que reforcem a imagem do produto que se pretende vender. Numa zona de montanha como esta, o turismo seria melhor servido por uma estrada lenta, panorâmica, com um traçado, um pavimento e uma sinalética que constantemente lembrasse os condutores do local em que se encontram, que obrigasse à circulação a velocidades reduzidas porque qualquer curva pode ser mais fechada do que aquelas a que as IPs nos habituaram e atrás de cada curva pode encontrar-se inesperadamente gelo, um rebanho, um turista pedestre. Pois bem, este novo pavimento e esta sinalética dão ao condutor as mensagens inversas.
Mas assim vamos, no rumo de sempre. Tomando quase sempre as decisões erradas, quase nunca as certas, e executando-as, umas e outras, sempre do pior modo possível. De quem é a culpa? Desta não podemos culpar o governo. O dinheiro pode vir de Lisboa, mas vem porque nós o pedimos. A culpa é nossa e só nossa.
13 comentários:
"é liso, lisinho, como a pele de uma gueixa japonesa"
Impressionante essa sensação/comparação táctil, tratando-se de alcatrão.
Ah, tecelão, isto foi só a "pena" a correr, um "pequeno" exagero!
E eu sei lá quão lisa é a pele de uma gueixa japonesa! (Só espero que a minha mulher leia isto... ;)
Saudações!
Pois, é isso! Isso é o que faz precisamente (suponho) o Presidente da Câmara de Manteigas: Não pede dinheiro para a estrada N232 – Manteigas-Penhas Douradas. Estreita, «panorâmica, lenta, q.b.», com paredes e aquedutos a ameaçarem ruir (o que vale é os últimos Invernos não terem sido chuvosos). É um luxo… É tão mazinha que o «Google maps» prefere o atalho. Acham que nós – os do interior – merecemos isto? Não pagamos Impostos? Ou somos (ou queremos ser…) masoquistas!
Sobralfilho, a estrada N232 que refere está onde está, com as paredes e aquedutos como estão, há dezenas de anos. Não pode garantir que teriam ruído se os anos tivessem sido chuvosos (nem eu posso garantir o contrário, claro). A estrada e as suas obras de arte podem necessitar arranjos, de manutenção, claro. Mas não percebo porque se há-de gastar fortunas pavimentando absurdamente uma estrada de montanha como aquela, com o pouquíssimo trânsito que a percorre. Diga-me que Manteigas precisa de bons acessos à capital de distrito e aos municípios com os quais mantém laços (culturais, empresariais, familiares) estreitos? Concordo, e acho que até os tem, excepto relativamente a Gouveia e Seia. Mas francamente, será importantíssimo para Manteigas ter ligações tão rápidas para Gouveia e Seia como já as tem à Guarda, a Belmonte e à Covilhã? Talvez, mas nesse caso a única opção parece-me ser por túneis, que não se vencem rapidamente aqueles montes de outro modo. Mas sobretudo não me parece que sejam necessária uma grande beneficiação dessa estrada para que os Manteiguenses posssam gozar as Penhas Douradas, assim como não é necessária esta absurda estrada de montanha que refiro no post para os covilhanenses gozarem as Penhas da Saúde.
Um dos pontos do meu post é que com pavimento especial de corrida ou sem pavimento especial de corrida, as estradas de montanha são perigosas, e nelas deve-se circular lentamente. O pavimento especial de corrida encoraja as acelerações nas rectas, logo, as surpresas desagradáveis nas curvas. Resolver este dilema? Só mudando também o traçado, com vias rápidas (autoestradas até, porque não?) serra a fora. É isso que quer, sobralfilho?
O outro ponto do meu post é que me parece que o turismo de montanha ganha com estradas que criem ou reforcem a sensação de se estar num local remoto, meio selvagem, especial, um local que impõe respeito e admiração, estradas que gritem bem alto que não se está num local qualquer, não se está na IP3. O sobralfilho não concorda comigo neste ponto?
Ou, concordando comigo, acha apesar disso que alcatrão e vias rápidas, até mesmo pela serra a dentro, trazem só por si o desenvolvimento e a felicidade das populações? Veja o desenvolvimento e a felicidade que o asfaltamento da estrada da Portela do Arão para a Lagoa Comprida trouxe a Loriga!
E não me espanta que o google maps prefira o atalho. Todos os condutores de veículos ligeiros que o conhecem o preferem.
Saudações!
ljma,
Fique tranquilo. Concordo consigo em quase tudo o que tem escrito no blogue sobre a Serra de Estrela. Mesmo nas vias de comunicação, a divergência é de pouca monta. Não valorizo uma auto-estrada pela Serra fora(Mesmo na planície, prefiro as estradas). Basta-me uma Estrada confortável (e não uma "vereda" como julgo que é a estrada N232). Com alcatrão, claro. Bem sinalizada e com largura suficiente para permitir a passagem a dois veículos. Não concorda comigo também neste ponto? Que também tem a ver com "segurança" de que fala. Mas, atenção não me aflige muito haver uma proliferação de estradas na montanha. Se elas (Montanhas) tem qualidade e benefícios devem-se poder usufruir plenamente por todos e não somente para os possuidores de gipe.
Saudações,
Sobralfilho, boa noite.
Afirma que lhe basta "uma Estrada confortável". O meu problema é que não há só uma na serra, há muitas, e constantemente se asfaltam mais! E justificam-se essas estradas com o turismo e o desenvolvimento quando até hoje elas não trouxeram nem um nem outro. (Como tenho dito, isto que nos enche as estradas em certos fins de semana de inverno não é turismo a sério.)
A estrada N232 não é uma vereda. É uma estrada sinuosa, decerto, mas haverá outra possibilidade com esta orografia? Essa qualificação ("vereda") aplica-se com muito mais propriedade ao atalho que referiu. Mesmo assim, este atalho é perfeitamente transitável por veículos ligeiros, tanto que todos os que o conhecem o preferem. Não é apropriado para pesados por causa dos declives e da pequena largura da estrada. Por isso os pesados vão pela N232.
Eu concordo que as montanhas devem ser usufruídas por todos o mais possível. Mas a multiplicação das estradas de asfalto a que temos assistido na serra da Estrela nos últimos quarenta anos impede o usufruto daqueles que pretendem viver o ambiente natural da serra, em favor dos que a querem admirar de dentro de automóveis em movimento, ou dos que pretendem apenas uma visita rápida. Além disso, há usufrutos impossíveis de "facilitar". Como argumentei há algum tempo, a excitação da investigação científica não se pode dar a usufruir a pessoas sem formação simplesmente por lhes abrirmos as portas dos laboratórios. A serra não se dá verdadeiramente a usufruir a quem a percorre de carro. Como da serra da Estrela dizia o Miguel Torga (num tempo em que muito menos estradas a percorriam), "Somente a quem a passeia, a quem a namora duma paixão presente e esforçada, abre o coração e os tesouros. Então, numa generosidade milionária, mostra tudo."
Nós no interior pagamos impostos, sim. Mas eu gostava que fossem utilizados no desenvolvimento do interior, e não em permanentes beneficiações da estrada N339 (de utilidade muito duvidosa) e em permanentes asfaltações de caminhos vários, que não se vê que contribuição têm dado para esse desenvolvimento. Eu, pelo menos, não a vejo.
Mas muito obrigado pela sua intervenção, sobralfilho. Vá "apitando"! Bom trabalho com o "Nasci aqui"
ljma,
Não quero ser maçador. Procurarei ser breve e dar-lhe conta do modo como passei a tarde de ontem, dia 9. Mas, antes deixe-me dizer-lhe que vejo por aí uma tendência economicista. Há provavelmente investimentos que não foram feitos a tempo e horas. E claro também há turistas que não querem “ver”. Numa viagem querem correr tudo num dia. Como diz, não é turismo a sério. Então, os responsáveis devem tentar ensiná-los a ser turistas.
Convenhamos a N232 não é uma vereda – foi a força da minha expressão.
Conheço o Miguel Torga. Mas, olhe que não terá vindo de burro!
Ontem, com a colaboração dum amigo que tem um jipe, desloquei-me de Belmonte, Fernão Joanes, Videmonte (estrada “mais que confortável”).
Depois Qta da Taberna, Sra. da Acedasse, Covão da Ponte, N232, atalho, Manteigas. Como sabe da Qta da Taberna até ao Covão da Ponte a via não tem alcatrão. Vi perdigotos (não vi a perdiz), gaios, penso que 2 casais de pombos bravos (a trajectória de voo que seguiram dificultaram a identificação). Alqueives de centeio. Um conjunto de homens a carregar feno em camionetas. Um deles em dado momento tomando um atalho ultrapassou-nos e mais a frente vimos a carga de feno que balouçava com os solavancos do caminho. E um fardo de feno lá seguia a rebolar no chão preso à uma das cordas. Não podíamos fazer-lhe sinal, pois o pó levantado do caminho não permitia. Mais à frente o homem parou, contou os fardos. E disse-nos que no atalho pelo qual nos ultrapassou teriam caído pelos menos 15 fardos. Iria proceder à descarga e voltaria lá atrás a recuperá-los. Tinha-se levantado às 5 horas, eram 18 horas e só lá para 21/22 horas terminaria o seu dia.
E se o caminho fosse alcatroado? Pois, poderia ter caído a carga e poderia (o mais certo) não ter caído… Não é? Para aquele homem terá sido um incidente de percurso. E à boa maneira portuguesa alguém dirá: “E teve muita sorte poderia ter sido pior”…
Um abraço,
Sobralfilho, viva!
Não é nada maçador, ora que essa! Esteja à vontade.
Tem que me explicar mais detalhadamente isso do economicismo, porque não estou a ver o que pretende ao certo dizer.
Tem razão quando diz que a vida desse trabalhador rural ficaria facilitada com uma estrada asfaltada. A desse e a de outros, às centenas ou milhares, espalhados por quintas e outras explorações de todo o país, em regiões de montanha e em regiões sem ser de montanha, que não são servidas por estradas de asfalto.
Aqui à beira da serra há muitas. Mas que estradas é que eu critico aqui? Não são essas que poderiam servir quintas isoladas (e que poderiam perfeitamente não ser mais do que aquilo que o sobralfilho chama "veredas"). São as estradas para levar turistas à neve.
Não acredito que se possa "ensinar" os turistas. Eles vêm ao que nós oferecemos. Se oferecemos natureza, trilhos, actividades de descoberta e de comunhão com a natureza, seremos visitados por isso. Abrindo estradas, elas serão utilizadas por visitantes. Infelizmente, quanto mais estradas se abrem, mais os turistas dispostos a caminhar a pé por espaços naturais bem preservados se afastam para bem longe da serra. Ou seja, é com estradas anunciadas para turistas e outras coisas anunciadas para turistas que temos afastado os turistas de montanha da nossa serra, é com estas coisas anunciadas para turistas que temos, década a década, construído o turismo que temos. Estamos no rumo certo, estamos de parabéns? Eu acho que não e por isso peço que o mudemos.
Saudações!
Só mais uma coisa.
Não sei como é que o Torga chegou à serra, nem isso me interessa. Não é de como se chega à serra que eu falo. Eu falo é de como a damos a visitar, a percorrer, a descobrir, a usufruir.
Não sei como é que o Torga chegou à serra. Mas, se a tivesse visitado e percorrido do modo que colectivamente temos cultivado e que eu tenho criticado neste blog, duvido muito que dela tivesse escrito o que escreveu.
Saudações!
ljma,
Visito o “Cântaro zangado” há mais de dois anos. Pareceu-me ver naquilo que tem escrito que uma das razões porque não é favorável aos melhoramentos que os responsáveis introduzem ou pretendem para a Serra de Estrela era económica. Ou seja, que os aspectos económicos deviam prevalecer nas obras realizadas ou projectadas. Hoje, revi alguns “posts” e atrevo-me a pensar que estou afastado da verdade, concluindo, portanto, que o que o move é tão-somente o turismo verdadeiro de montanha.
Ora, sendo eu um turista normalíssimo (vulgar) que tanto pode praticar o pedestrianismo (o que já fiz e posso continuar a fazer mas, com reservas), como andar de burro, ou de automóvel, que gosta de ver, fotografar e, sobretudo, respirar, fico arredado (pelo facto de andar de automóvel) do seu conceito de turista. Assim sendo, ó óbvio que tento aqui chegar a brasa à minha sardinha.
Um dia de finais de Junho de 1954/1955 (?) cheguei cheio de pó (“borralho”) numa camioneta de caixa aberta com bancos carregadinha de garotos à Colónia Infantil da Montanha – hoje Pousada da Juventude – ali nas Penhas da Saúde. No dia seguinte, fomos a pé, claro, até à Nave de António. Nos quinze dias que lá estivemos, e nos outros quinze dias no ano seguinte, resultaram numa grande paixão pela Estrela que permanece. Lembra-se que na Covilhã houve, em tempos, autocarros penso que diários no Verão para Serra? Eu utilizei frequentemente este serviço. Lembra-se que na década de (19(50) os Covilhanenses, aos fins-de-semana, iam e regressavam a pé, em conjuntos (ranchos) de pessoas de farnel às costas? Eu do sítio onde estava, um pouco acima da Varanda dos Carqueijais via-os passar. Estimo e gosto que os outros estimem a Serra de Estrela, E também não gosto que a transformem num “Algarve serrastreliano”. Penso que neste ponto estaremos em igualdade…
Olhe que sim, olhe que sim: O Turista pode ensinar-se. Será uma questão de marketing…
De facto, nem a si, nem a mim interessa o modo como Miguel Torga subiu à Serra. Nem eu sou conhecedor de tudo quanto escreveu sobre a sua centralidade e a influência que teve nas gentes da Beira Serra. Seja como for, ele terá vindo antes de 1950 e terá vindo mais vezes depois. As estradas eram piores e o meio de transporte também, por isto e pela sua maneira de “olhar” escreveu tão profundamente sobre a Serra. Veio peregrinar… Gosto do que escreveu. E agora, ljma, pasme: Não gosto daquilo que não escreveu (sou suspeito porque como disse atrás não conheço todas a sua obra, mas, mesmo assim, atrevo-me. E se de facto escreveu – que me perdoe, lá do “assento etéreo” em que estiver e os leitores deste blogue também. Ele não falou das propriedades curativas da Serra de Estrela: As suas “águas”: Manteigas e Unhais. E os seus “ares”. Viu? Sentiu? Ou não “quis” ver. Não viu o edifício imponente do Sanatório? Não se interrogou? Ou não foi informado ou era Tabu, à época… Sabe-se que durante anos a doença pulmonar era Tabu e a cura pela água também levantava muitas dúvidas… Como médico devia ter dito alguma coisa…
Há dois tipos de turistas: os que querem “ver” e os que não “querem ver”.
Continue,
Saúdações,
Caro sobralfilho,
Fico muito contente por saber que lê o Cantaro Zangado há já tanto tempo. Espero conseguir continuar a merecer a sua visita regular.
Aquilo que me motivou a criar o blogue e que me motiva a continuá-lo é em primeiro lugar a preservação do ambiente e da paisagem da serra. Faço-o de forma completamente egoísta. Cresci a perder-me nestes montes, a sonhar com eles, a neles planear e executar actividades. Pedestrianismo, escalada em rocha e gelo, esqui de travessia, BTT, canoagem, já fiz (e tento continuar a fazer) de tudo. Nunca atingi níveis elevados em nenhuma destas modalidades, mas isso é o que menos conta. Pratico-as apenas pelo prazer que me dão. E é só pelo prazer que me deram e dão que sinto que devo manifestar-me na defesa da paisagem e ambiente serranos, contra o que considero ser uma agressão permanente e continuada, que dura há dezenas de anos.
Mas as minhas maluquices são pessoais e intransmissíveis e, por isso mesmo, não têm grande peso na hora de alinhar argumentos contra ou a favor determinada medida ou plano de investimento na serra. Por isso mesmo, e como me parece natural e desejável num processoo de discussão, tento usar argumentos mais universais de diferentes tipos. Um deles é o que chama preocupações economicistas. Entendo que não se devem fazer investimentos que não tenham retorno. Esta posição, por si só, não me parece economicista. A palavra economicismo costuma aplicar-se quando se avalia o retorno de um investimento apenas em termos estrictamente económicos, e também quando se faz essa avaliação considerando um intervalo de tempo muito curto, não considerando os retornos de longo prazo. O que eu acho é que os meios de que colectivamente dispomos são finitos (pior: são escassos) e por isso não podemos andar a atirá-los ao ar, com grande optimismo e voluntarismo. E entendo que é isso que temos andado a fazer. Se quiser, sou economicista quando falo do absurdo desperdício que foi a tentativa de construção do teleférico Piornos-Torre. Talvez.
Outra classe de argumentos que invoco para justificar as minhas tomadas de posição é a do desenvolvimento do turismo. Mas, como com os argumentos económicos, invoco estes apenas porque considero que um turismo de montanha como existe nas outras montanhas europeias (por exemplo, no Gerês) é menos prejudicial para a "minha" paisagem e o "meu" ambiente do que estas enchentes nalguns (poucos) fins de semana em que por cá temos apostado. Não é tão prejudicial, e é muito mais lucrativo, para muitas mais pessoas, de muitas mais freguesias. Mas não tenho qualquer interesse pessoal e directo no desenvolvimento do turismo. Eu sou um poco mais novo. Nasci em 1965, não tenho memórias da serra anteriores a 1970... Mas pelos vistos temos experiências semelhantes na génese do nosso interesse pelas coisas da serra. Porque sou mais novo, não me lembro dos anos 50 mas creio que esse serviço de carreira Covilhã-Penhas da Saúde durante Verão ainda existe; existiu no ano passado, pelo menos.
(Continua)
(Continuação)
Sobre o ensinar dos turistas, parece-me que estamos mais ou menos de acordo. Tudo depende do que lhes vendemos e de como o apresentamos. Uma questão de marketing, como diz. Mas sei que não há campanha, não há marketing que consiga vender as redondezas da Torre (por exemplo) a turistas que procurem espaços naturais. Dir-me-á que a Torre é um caso único, gritante, particularmente grave? Sim, mas e os Piornos, com aquele mamarracho que para lá ficou das obras dos teleféricos? E as Penhas da Saúde, cada vez mais uma aberração urbanóide? E o Sabugueiro, um antro de mercantilismo rasca? E os parques eólicos que agora aparecem como cogumentos (e há mais planeados)? E os postes de electricidade abandonados por todo o lado? E as vizinhanças de todos os hotéis da Turistrela, cheias de lixo e de restos das construções? E os carros que enchem todo o maciço central nos fins de semana de Inverno? E que marketing estamos a fazer quando anunciamos novos projectos de teleféricos para a Torre ou de novas estradas asfaltadas (e tudo em nome do turismo!)? Bom, aquilo contra que escrevo aqui no blogue é o agravar e o multiplicar destas vergonhas, que acredito serem o resultado do marketing errado.
Sobre o Torga, bem, eu nem sou um grande leitor do Torga. Mas isto que ele disse sobre a Serra parece-me uma verdade das mais evidentes. E creio que frequentemente nos esquecemos disto quando pretendemos "arranjar" a serra com parques de estacionamento, mais e melhores estradas ou telecabines. Dito isto, aceito que nem toda a gente possa calcorrear os trilhos (não sei porquê, desde que consiga andar, mas siga). Assim, não pretendo que se proíba a vinda à serra dos turistas que, como diz, não "querem ver". Entendo é que, para esses, a serra já tem muita oferta (já tem a mais, até). E, continuando a desenvolver a serra para esses, continuaremos a ter enchentes absurdas em poucos fins de semana e cada vez menos turistas (desses e dos outros) em todos os dias do ano.
Saudações!
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