terça-feira, agosto 14, 2007

A maxi-iluminação da mini-cidade

Tenho passado temporadas de férias nas Penhas da Saúde desde que me lembro. Desde que me lembro que acontece, em noites de Julho e Agosto particularmente amenas, ficar na conversa à noite, na rua. Nessas ocasiões, os olhares e, por vezes, as conversas iam parar às estrelas, cuja presença se impunha, ostensiva. Foi assim com os meus pais, quando era criança, foi assim mais tarde, com as namoradas, foi assim com os meus filhos, mais recentemente.
Até que a Câmara Municipal da Covilhã resolveu transformar as Penhas da Saúde numa magnífica mini-cidade (ver mais propaganda aqui), com iluminação pública à altura de uma magnífica mini-cidade. O ambiente nocturno das Penhas da Saúde agora é o que a fotografia acima ilustra. Parece a segunda circular, em Lisboa. A abóbada celeste já não se impõe como antes, já não é evidente, com um relance pela janela, se (feliz ou infelizmente) há ou não luar.
Pela iluminação pública, já não se notam diferenças entre as Penhas da Saúde e qualquer pólo turístico urbano. Pela iluminação pública, existem agora menos razões para preferir as Penhas da Saúde a Quarteira.
Talvez a Serra da Estrela ainda seja, um pouco, Onde a Natureza Vive (como propagandeia a Região de Turismo). Mas, nas Penhas da Saúde, ela vive um pouco menos desde que se levou a cabo esta "requalificação".
Passo a passo, vão-nos levando a natureza. Passo a passo, vão-nos deixando o quê?
E tudo isto, para quê?

A fotografia foi tirada sem flash, sem tripé, sem apoio especial. O tempo de exposição (regulado pelo modo automático da câmara) foi suficiente curto para a imagem não ter ficado tremida. Daqui se pode fazer uma ideia mais clara da claridade das noites nas Penhas da Saúde.

9 comentários:

TPais disse...

Nas noites que passo no covão da Ametade ou até mesmo na Lagoa Comprida já consigo ver no horizonte algo que nunca antes via!A aurora (não a borela) de luz meio alaranjada que emana das Penhas da Saúde! Então em noites com nuvens o efeito é ainda mais notório!! Mais um potencial atrativo na Serra que se vai minguando!Querem ver as chuvas de estrelas o melhor mesmo é irem para o meio do alentejo onde ainda não existam minicidades como esta!

Rui Peixeiro disse...

Bons velhos tempos, em que para ir de casa ate à ponte ou ao café ao parque de campismo, íamos a "apalpar" terreno ou as "meninas" lá levavam uma lanterna...

Até posso aceitar/concordar com um reforço da iluminação naquela zona, mas não precisava de ser tanta e talvez as "velhinhas" lâmpadas brancas ficassem melhor, pelo menos existiria maior distinção cromática.

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

A questão aqui é a velha mentalidade à portuguesa de pensarmos que somos ricos...é assim em relação a muita coisa, incluindo a "água" e a "energia".

Lembro-me de um estudo feito pela ENERAREA (Agência Regional de Energia e Ambiente do Interior), que pude ler há una anos na imprensa regional, que alertava para os enormes desperdícios ao nível da iluminação pública na Beira Interior; e se fosse apenas a este nível (que dizer da energia que se desperdiça nas nossas casas, simplesmente por serem mal feitas de um ponto de vista energético,levando a consumos brutais para as tentar aquecer de inverno e o inverso de Verão).

Como escrevia há dias o Sarsfield Cabral no "Público", na ausência de riquezas energéticas, o país tem que apostar na eficiência energética e parar de deitar "energia ao lixo" (o mesmo em relação à gestão da água).

Parecemos um país do Golfo a nadar em "petrodólares"...um dia mais tarde, (mais cedo do que esperamos), vamos começar a pagar estes desperdícios no nosso dia-a-dia. Neste caso em concreto, talvez tenha sido intenção da CMCovilhã permitir que, mesmo à noite, possamos admirar os mamarrachos das Penhas...não havendo outros monumentos para iluminar!

ljma disse...

Pois, romantismos à parte, a questão pode também ver-se, obviamente, em termos de gestão energética. E coloca-se imediatamente a questão: quantos megawatt-hora per capita são gastos em média anual, na iluminação pública das Penhas da Saúde? E quantos são gastos na Bouça, no Tortozendo, em Unhais, por exemplo? Aposto que a comparação daria pano para mangas... Sobretudo porque esses megawatts (uns e os outros) são pagos pelos nossos impostos. Ora, todos os cidadãos devem ser tratados da mesma forma pela administração pública. Os das Penhas (quantos são, numa média anual? Chegarão a cinquenta?), como os das outras localidades.

Não sei se mais alguém se lembra, mas quando esta maxi-iluminação foi inaugurada, houve alarmes de incêndio em número suficiente para o caso chegar aos noticiários televisivos. As pessoas notavam o clarão avermelhado nos bancos de nevoeiro atrás da cumeada da colina da Covilhã e pensavam que era o fogo!

José Amoreira

Al Cardoso disse...

Depois vem pedir ao simples comsumidor, para trocar as lampadas em casa para poupar energia!!!

Um abraco do norte da "Serra".

TPais disse...

É bastante notório como de ano para ano sempre que passo o tunel da gardunha em direcção à estrela vejo com mais clareza o que parece ser uma cidade flutuante!As Penhas Saude são a única coisa que ilumina a montanha bem acima da Covilhã!Palavras para quê, é o verdadeiro enquadramento ambiental!Hoje em dia as Penhas são o farol da Beira!

francisco t paiva disse...

Lamentavelmente, o desperdício energético não se verifica só nas Penhas da Saúde, como constata o Cântaro Zangado. Deixo-lhe um extracto de uma carta publicada no Notícias da Covilhã, há um ano atrás, que partilha a preocupação e corrobora a posição expressa pelo José Amoreira, mas em relação a toda a área urbana. O fenómeno é notório quando, atravessando o túnel da Gardunha, nos deparamos com a colina da cidade completamente iluminada.

"A dependência energética é responsável por uma boa percentagem do deficit da balança comercial externa do País. Tal facto deve constituir preocupação económica para os particulares e para as entidades públicas e assumir crescente pertinência por razões de ordem ambiental.

A expansão da área urbana da Covilhã, não obstante poder traduzir-se numa importante fonte de receitas municipais, representará a prazo um substancial acréscimo do custo de manutenção das inerentes redes infraestruturais (vias de circulação, electricidade, telecomunicações, gás, resíduos, transportes públicos, etc.). Tais encargos recairão inevitavelmente no nosso bolso. Donde, o imperativo de alertar as autarquias para a sua responsabilidade neste domínio.

Quanto pouparia o erário público com uma racional gestão da iluminação pública da Covilhã? A rede de iluminação pública municipal apresenta, a olho nu, demasiadas incongruências, algumas de fácil resolução. Apontamos apenas duas irracionalidades, cuja correcção reduziria sobremaneira os gastos: a multiplicação de luminárias na mesma estrada – presença simultânea de candeeiros a diversas alturas, com sobreposição desnecessária dos cones de luz –; a iluminação permanente de caminhos rurais, ramais de acesso e outras vias sem trânsito, que não aproveita a ninguém."

TPais disse...

Francisco, obrigado por essa "memória" recente publicada no Noticas da Covilhã!
A verdade é que este desperdicio em iluminação publica não é exclusivo da Covilhã ou da Beira. Ainda ontem conduzia da Ericeira para Oeiras via Sintra e passei por inumeras estradas onde não existia uma única casa e onde a frequencia de postes de luz era de tal ordem que pensei estar no meio de uma localidade!Poderia até apagar os farois que não faria diferença!Aliás por estes lados acontece muito vermos condutores de farois apagados à noite simplesmente porque se esqueceram de os ligar e depois não deram por isso tal era a intensidade da iluminação publica!
Se se reduzisse a frequencia de fontes de luz nestas estradas para metade, se se fizesse isto por Portugal fora e ainda se multiplicassemos isto por 365 noites ao ano, imaginem quantos KWs se poupavam!Quanto CO2 deixaria de ser emitido? Quanto dinheiro poderia ser aplicado em coisas de maior necessidade?

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Padecemos desse "defeito de base" de querermos sempre, através do esbanjar dos parcos recursos do país, causar a ilusão de que somos ricos e nos podemos dar a esses luxos.

E nunca percebemos que, em última análise, tal nos "sai do bolso" através dos impostos que pagamos (e já nem falo, neste caso concreto da energia desperdiçada, das implicações a nível ambiental...as quais também agravam as consequências financeiras para o país; é que se Portugal ultrapassar determinadas metas a que se comprometeu, em matéria de emissão de gases com efeito de estufa, também terá que pagar elevadas multas).


Talvez que esta necessidade de contenção e rigor se torne mais "visível" quando a torneira dos fundos estruturais se encerrar.

É que em Portugal quando se fala de necessidades energéticas pensa-se logo em fazer mais barragens, mais centrais termo-eléctricas...agora até nos querem impingir de novo o nuclear! Mas nunca pensamos onde poderemos poupar, rentabilizar, tornar mais eficiente. É o tal "defeito de base", somos pobres porque pensamos e agimos como se fôssemos ricos! Essa é a nossa "cruz"...

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!