Como exercício académico, caro leitor, suponhamos que consideramos que o esqui é uma aposta razoável para o desenvolvimento do turismo na Serra da Estrela. Que temos defendido, então, as ampliações da estância que se fizeram até agora e outras que têm vindo a ser anunciadas. Para apoiar a procura crescente do produto neve que tão afincadamente temos promovido, concordámos com a necessidade da construção do edifício central da estância, para a venda de forfaits e o aluguer do material. Faça-se então a obra, e a obra fez-se. O resultado é o que pode apreciar aqui em baixo.
Agora diga-me: tinha mesmo que ser este enorme bunker cinzentão (com uma nota de cor dada apenas pela publicidade à Vodafone), sem nada que ver com a arquitectura tradicional da região, sem nada que ver, sequer, com a arquitectura turística típica das estâncias de esqui? Tinha mesmo que ser este caixote aparentemente inacabado que, apesar de baixo (do lado da estrada o tecto deste caixote está ao nível do chão), agride a visão desta encosta como um monte de entulho suburbano?
Já que estamos em maré de suposições, imagine o caro leitor que apresentava à Divisão de Urbanismo da Câmara de Seia um tal projecto de arquitectura. Qual acha que seria a deliberação dos serviços? Mas a pergunta mais interessante aqui até é outra: consegue o caro leitor imaginar-se com tão mau gosto, tão focado apenas no seu lucrozinho imediato, tão cego à beleza da Serra, a ponto de sequer sonhar em considerar a possibilidade de pedir autorização para a construção de um tal mamarracho no topo da Serra? Eu não.
Não compreende como é que foi possível isto ter sido aprovado? Eu também não. Mas podemos continuar a colocar hipóteses. Imagine que a Turistrela pretendia, não construir este caixote, mas sim um hotel, com mais dois andares, como o que mostro na figura em baixo, tirada de um suplemento do Jornal do Fundão de publicidade à Turistrela, publicado a 29 de Abril de 2005. Leia também o texto que a acompanha (clique na imagem para a aumentar).
Quanto a mim, esta proposta não é melhor do que o caixote que agora temos mas, ao menos, esta enormidade pareceria uma enormidade acabada, já seria assim a modos que "requalificada", para usar um palavrão da moda. Não se estranharia tanto, portanto, a sua aprovação pelos arquitectos da Divisão de Urbanismo. Por outro lado, é muito mais difícil vê-lo a ser aceite pelos serviços do Parque Natural da Serra da Estrela. É que um hotel, permanentemente habitado, tem necessidades muito maiores de água, de electricidade, de rede de esgotos, de espaços de aparcamento, etc.
Continuemos a colocar hipóteses. Será que a Turistela submeteu à aprovação da Câmara de Seia este projecto, em vez do do caixote? Será que foi a isto que os serviços da câmara deram a sua benção? Mas então como é que foi obtida a licença de utilização estando a construção tão flagrantemente inacabada?
Seja como for que se olhe para este mamarracho, vamos sempre parar à mesma pergunta:
Como foi possível ter-se aprovado tamanho atentado?
6 comentários:
Tem piada aquela parte do folheto que diz "aproveitar a estrutura existente" para construir o hotel!!Quem não saiba até parece que aquele bunker já estava ali há imenso tempo e que foi a turistrela que lhe deu utilidade!!Esperteza saloia a destes tipos da Turistrela. Mais, como se alguem acredita-se que aquela placa gigante a fazer de tecto do bunker não foi feita logo a pensar em levar mais prédios por cima! Na minha opinião esta construção deve ter sido aprovada de "boca", ou seja, a Turistrela disse ao parque, "vamos só fazer uma casinha de apoio e tal que nem se vai ver da estrada e tal.."!!O que me incomoda mais é pensarem que nos enganam com este tipo de esquemas mal disfarçados
Eu acho mais graça ainda à parte do "em perfeita harmonia com a magnífica paisagem circundante"...
Espero simplesmente que isto não passe de uma mera hipótese, pois se já me preocupam os esgotos da miséria que existe, então um dia destes a agua das ribeiras de Loriga estariam a partida digo a nascente completamente poluídas e teríamos o Mondego muito pior que o Alviela. Como pode constatar e estamos de acordo a Câmara Municipal de Seia dá uma no cravo e outra na ferradura e a sua Divisão de Planeamento e Urbanismo
não é de fiar (olhe que nada de pessoal me move contra a Câmara), mas tudo o que de reles se tem feito lá encima tem tido a anuência da Câmara de Seia, que alias muitas vezes nem reconhece aquela área como pertencente ao seu Município, transformando o alto da Torre quase numa zona Franca para a Turistrela. Já agora!!! Descubram quem é o autor do projecto, pode ser que se confirme aquilo que me passa pela cabeça! A junta de Freguesia de Loriga tem sido vítima daquelas promessas vãs e... olhe, aquilo que mais chateia é aqui em baixo uma pequena Unidade hoteleira de investimento holandês que tem sido sistematicamente chumbada, lá em cima é uma vergonha.??? Até Já.
"Zona Franca para a Turistrela"!!Boa, boa!!Se não fosse triste até me ria! Realmente, noutro blog comentei que a Turistrela era a versão serrana do movimento dos Okupas!Okupa tudo que seja edificios para transforma-los em propriedade sua e pretende okupar tudo que sejam locais de elevada beleza paisagistica para os explorar e retirar o lucro rápido!Só que nesta busca acabam por eliminar o interesse do local e eventualmente acabam por abandonar mais monos por ai fora.
Quanto à ribeira de Loriga, bom, as lagoas do Quelhas e do serrano já estão pejadas de sacos e o escoamento natural dos esgotos da Torre tambem vai lá dar. Aliás, algumas das margens já mostram algas a mais para o que é suposto ser uma água pobre em nutrientes! Loriguenses, não é só que se faz desse lado que vos afecta!Estejam atentos porque tudo o que se faz lá por cima afecta os que estão mais abaixo. Vejam lá se os Covilhanenses não proibiram os banhos na lagoa do viriato que lhes abastece as torneiras!!Mesmo que os atentados não sejam feitos no municipio de Seia, ou mesmo que este municipio os autorize não são obrigados a assistir resignados!
Abraço
Mas aonde estão as organizações ecologistas para organizar manifestações contra estes mausoléus da estupidez????
Palavra de honra... já frequento a Serra à uns 20 anos e sinto-me mesmo deprimido como as coisas mudaram... para pior... muito pior!
Hotel de ski????
Mas qual ski? Aquelas ridiculas 3 pistinhas perfeitamente horizontais, montadas numa montanha com 1995 metros, numa época de aquecimento global?
Aqui há uns tempos vi uma foto num jornal (penso que do Fundão), qu mostrava umas bicicletas empoleiradas nas cadeiras dos teleskis! RIDICULO!!!!
Terraplanagens para "Bikeparks" para justificar o uso dos referidos remontes mecânicos no Verão?!
Será que a nossa cultura não dá para mais?
Será que não existe por aí nenhuma organização ecologica COMPETENTE para denunciar estes atentados?
Será que têm de ser apenas alguns particulares (como este blog -valioso!) a meterem a cabeça no cepo??
É com muita pena que vejo a degradação completa de uma pequena e bela montanha que, precisamente por ser "pequena" e bela deveria ser acerrimamente protegida.
Paulo Roxo
Olá Paulo Roxo,
Obrigado pelo cumprimento. Valioso é o rppd!
Bem, somos pelo menos dois a partilhar uma certa depressão com o estado das coisas... Mas o pior é que as coisas não ficam quietas, está-se a planear pior, ocupando mais espaços na Serra, abrindo mais estradas, e já estão previstos apoios públicos para financiar estas "manifestações de vitalidade" da sociedade civil, incluindo, está-se mesmo a ver, a proverbial derrapagenzita financeira do costume (e ainda chamam parasitas aos funcionários públicos!).
Concordo contigo nas perguntas que colocas sobre as organizações ecologistas. Adaptando-as ligeiramente podemos com elas interpelar os partidos, diversos organismos do estado, ONG's de desenvolvimento regional, orgãos de comunicação social. Mas todas estas entidades colectivas vivem das pessoas, dos particulares (mesmo que no exercício das suas funções profissionais). Por isso, estamos de facto, indirectamente, a interpelar os cidadãos, os indivíduos. Ah, mas então estamos mas é a atirar pedras ao ar, que acabam, se formos rigorosos e imparciais, a cair no nosso próprio telhado de vidro: "e eu, não denuncio estes atentados? Pactuo, com o meu silêncio, com esta vergonha?". É por isto que comecei o Cântaro Zangado.
Nunca me vi a colocar a "cabeça no cepo" com este blog. Caramba, espero sinceramente não estar a correr nenhum risco especial. Estou apenas a dar a minha opinião, que, aliás, não é só minha (e sabes disso tão bem ou melhor que eu). E isto começou, de facto, como um esforço individual isolado, mas é cada vez mais uma coisa que me ultrapassa. Não falo aqui apenas da entrada do TPais, falo das participações de pessoas como tu (valiosíssimas!) e outros.
Muito obrigado, mais uma vez. Vai aparecendo, faz de conta que estás em tua casa!
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