segunda-feira, julho 30, 2012

Um discurso realmente moderno e original

antes me referi a isto, mas não me importo nada de reforçar a ideia. Há pelo menos um autarca na região da serra da Estrela que, quando fala de turismo na serra, fala efectivamente de turismo. Refiro-me ao Presidente da Câmara Municipal de Manteigas e este fim de semana tivemos mais uma oportunidade de verificar isto que digo.

No domingo passado, a Câmara Municipal de Manteigas organizou uma jornada de divulgação do Manteigas Trilhos Verdes, uma rede de trilhos pedestres do concelho com cerca de duzentos quilómetros de extensão total. A coisa envolveu uma caminhada com almoço e palestra no Covão d'Ametade e teve como convidado especial João Garcia, o único português que escalou todas as catorze montanhas com mais de oito mil metros (foi décimo nono em todo mundo a fazê-lo e o décimo a consegui-lo sem oxigénio engarrafado). João Garcia, que foi o orador da palestra, foi nomeado "embaixador" dos trilhos de Manteigas. Esmeraldo Carvalhinho, presidente da câmara, participou em todas as actividades, incluindo a caminhada. Veja aqui a reportagem que a localvisão fez do acontecimento (encontrei-a no blog Manteigas):

Eu acho que é com este tipo de eventos que realmente se promove o turismo na serra da Estrela. Mais, muito mais do que com rampas automobilísticas, snow-fashions, episódios dos "morangos com açúcar" ou passagens da Volta a Portugal em bicicleta. Coisas como estas não chegam a tantos eventuais clientes, nem enchem efemeramente os hotéis da região. Mas são iniciativas de divulgação dirigidas directamente aos que mais facilmente se convencerão a passar aqui na serra uma semana, em vez de apenas uma tarde ou (com sorte) um fim de semana; aqueles que se sentem mais inclinados a visitarem a serra noutras alturas que não aqueles feriados de neve e confusão; aqueles que procuram regularmente as montanhas como destino de férias, tanto no verão como no inverno. Em suma, acções como estas estão dirigidas aqueles que em todas as cadeias montanhosas do mundo moderno constituem os clientes do turismo de montanha (que não é, como já mostrei com exemplos até dos Pirenéus, só neve).

Oiça-se o presidente da Câmara Municipal de Manteigas falar sobre turismo na serra da Estrela e compare-se com o discurso e as opções do jurássico Carlos Pinto, da Covilhã. Onde este fala em construir, construir, construir, construir (barragens, estradas, teleféricos, postos da GNR, minicidades, casinos, centros de estágio desportivo, piscinas, centros comerciais, pistas de neve artificial para desportos de inverno) e de concorrência com as estâncias dos Alpes e dos Pirenéus (que, repito, não são só neve, ao contrário do que ele parece pensar), Esmeraldo Carvalhinho fala de divulgação dos trilhos que assinalaram no terreno, da paisagem, do ambiente e das actividades que os visitantes podem praticar na serra. Qual destes dois discursos atrairá mais turistas amantes de montanhas, e qual deles os afugentará para outras montanhas, como o Gerês e Montesinho, para não ir mais longe?

Não estou ligado a Manteigas, não vou lá tão frequentemente quanto desejava, não sei bem o que lá se passa. Se votasse em Manteigas, não sei se votaria em Esmeraldo Carvalhinho. Mas, no que se refere à serra, caramba! Na minha opinião, o homem está anos luz à frente de Carlos Pinto e da maioria dos restantes presidentes de câmara da região.

Adenda: O título deste post trazia associada uma ideia que acabei por não desenvolver no texto, por esquecimento. O discurso de Esmeraldo Carvalhinho não é, a bem dizer, especialmente moderno nem original, num contexto global. O que ele diz e faz anda-se a fazer nas montanhas da Europa há dezenas de anos. Mas é moderníssimo e verdadeiramente original nesta santa terrinha onde quase todos, nos últimos 40 anos, quando pretendem falar de turismo na serra, acabam apenas a falar de construção civil, de urbanizar a maior área possível, de asfaltar tudo o que se puder (e mais ainda) e a delirar sobre concorrência com os Alpes e os Pirenéus no turismo de neve.

6 comentários:

Rui Sousa disse...

Ao ler este post não pude mais uma vez de me rir às gargalhadas com este artigo:

http://www.asbeiras.pt/2012/07/opiniao-turismo-de-natureza/

Tanta conversa, talvez escrita por algum assessor, para uma realidade tão distante...

Rui Sousa
http://vivercidadeguarda.blogspot.pt/

Anónimo disse...

Uma lufada de ar fresco e, finalmente um sinal de inteligência por parte de uma tutela na Serra da Estrela. Esperemos que seja o inicio da compreensão de que o futuro do turismo da Estrela está nas actividades de natureza e nas suas multiplas implicações.
A ver se aqui, em Marrocos do norte, neste cantinho europeu gerido por mongolóides de espírito, começamos finalmente a evoluir, nem que seja um milimetro.

Paulo Roxo

Tiaguss disse...

O município de Manteigas está a fazer uma aposta acertada para o futuro. Parabéns a toda essa equipa.
No entanto como complemento a este turismo na natureza, não podemos deixar passar em claro as restrições à escalada nos principais locais da Serra da Estrela.
Na reportagem da Localvisão, ao minuto 1:03 alguém estava a cometer uma infracção na parede que serviu de iniciação à escalada durante anos. Que mal estavam a fazer?? Ha que rever esta politica que proibe a escalada no Cântaro Magro, na Francelha nos Fantasmas, etc.

Anónimo disse...

Na minha opinião, as proibições totalitárias absurdas de escalar na Serra da Estrela (envolvendo básicamente TODAS as paredes interessantes e HISTORICAS) são fruto de uma grande ignorância por parte dos decisores relativamente à actividade. Mas, parte dos culpados somos nós, os próprios escaladores que somos aversos à união e que, para piorar, também herdámos um hábito muito provinciano, que consiste em aceitar todas as decisões de orgãos oficiais suspeitos sem qualquer contestação. "Eles" decidem e fazem as leis e "nós" encolhemos os ombros e simplesmente aceitamos, solicitos. E com o compadrio das federações que deveriam ser as primeiras a colocar a questão: proibido, porquê?
Meus amigos, o levantamento das proibições da escalada na Serra da Estrela passa por nós. E a primeira medida para levantar essas proibições é... escalar na Serra da Estrela! E escalar ás claras. Sem andar a fugir e a esconder o material como se fossemos marginais.
Expliquem-me as coisas convenientemente e eu iriei acatar as restrições (equilibradas e devidamente fundamentadas). Digam-me que está proibido "porque sim" e, como é evidente, não irei ligar um chavo ás pseudo leis institucionais.
Repito: (em minha opinião) a melhor forma de se começar a lutar contra as proibições é ignorar as mesmas e ir escalar.

Paulo Roxo

ljma disse...

Tiaguss, também reparei nesse tipo escalando a placa dos fantasmas, mas apenas sub-liminarmente. Só quando o referiste emergiu à minha consciência. E claro que concordo contigo.

E também concordo contigo, Paulo. Hoje fui para lá escalar com o meu filhote de 13 anos. No fim, perto da uma da tarde, quando iniciámos o caminho de regresso, uma família de holandeses (ou lá o que diabo fossem) estava a chegar à parede. Um deles trazia cintas express, a outra uma corda, todos já equipados de arnês, as crianças de capacete. Iam, obviamente escalar um bocadinho, e eu achei muito bem.

Trata-se de uma proibição que ninguém respeita (e ainda bem!) e que ninguém consegue fazer cumprir. Aliás, nem sei se alguém pretende mesmo fazê-la cumprir. É apenas um disparate de um manga de alpaca. Porque nem sequer está expressa na lei, nem no plano de ordenamento do PNSE. O que o plano de ordenamento diz é que nas zonas de protecção de tipo 1 (aquelas onde se encontram as paredes de escalada tradicionais [as melhores]) apenas são permitidas actividades de pastorícia, de investigação científica e de "visitação", desde que não tenham impactos considerados prejudiciais. Ora, a escalada é considerada uma actividade de visitação, li eu num documento do antigo ICNB (agora ICNF). Portanto, se a escalada não é autorizada é porque se considera que tem impactos prejudiciais. Quais são? Ninguém sabe. E tantas coisas são permitidas, com muito maiores impactos do que a escalada, exactamente nas mesmas áreas onde a escalada é proibida!...

Portanto, o melhor, à falta de um movimento que consiga por cobro a isto por via oficial, é mesmo não ligar, e escalar onde se quiser, quando se quiser. Se alguém me multar, se calhar nem pago e eles que levem a coisa a tribunal, que havia de ser giro! (Mas isto sou só eu a falar num blog; se me acontecesse, antes de decidir haveria de falar com um advogado e considerar muito cautelosamente o que fazer)

Anónimo disse...

Gostava que um dia este Blog fizesse uma matéria sobre a praia Fluvial de Loriga . É apenas uma sugestão

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!