Uma análise comparativa no rescaldo da visita organizada pela ASE - Associação Cultural dos Amigos da Serra da Estrela para os seus associados ao Parque Natural do Lago de Sanabria (Zamora, Espanha)
Situado a escassos quilómetros da fronteira portuguesa, a Norte de Trás-os-Montes, o Parque Natural do Lago de Sanabria oferece-nos uma realidade bem diferente da que estamos habituados nas áreas protegidas do nosso país.
Comparável em muitos aspectos com a Serra da Estrela, tais como a sua natureza geológica e geomorfológica, clima, altitude ou vegetação potencial dominante, desde há muito que as duas serras seguiram percursos diferentes.
A paisagem abaixo dos 1.500m é dominada por bosques de Carvalho-negral (Quercus pyrenaica). Maioritariamente constituídos por árvores jovens, pontuados por carvalhos centenários, estes bosques bem conservados traduzem a relação das populações locais com a floresta autóctone: a floresta é o seu bem mais precioso; de onde retiram o seu sustento, que garante a base de todo o sistema agro-silvo-pastoril de que dependem, e que interessa preservar também por ser um dos principais atractivos turísticos da região. É a gestão consciente e sustentável do património natural e cultural que por aqui tem permitido o equilíbrio entre o Homem e a Natureza e o bem-estar das comunidades locais.
Não se avistam pinheiros, acácias ou eucaliptos. A produção em monocultura de pinheiro ou eucalipto e a ocupação exponencial do território por acácias é em Portugal uma das principais causas para a perda de biodiversidade e degradação das nossas áreas protegidas, facilitando ainda a ocorrência e recorrência de incêndios florestais. São os Carvalhos, o Azevinho e os Teixos que, de entre as 1500 espécies de plantas que se podem encontrar no Parque Natural do Lago de Sanabria, trazem os visitantes a percorrer os muitos trilhos bem sinalizados, e que nos permitem adentrar pela serra desde os “pueblos” típicos e acolhedores, sejamos montanhistas experientes ou curiosos das belezas naturais.
Para chegar à Cascata de Sotillo, onde estivemos com o grupo da ASE, não há estradas alcatroadas, não há confusão de estacionamento, não há lixo. Apenas a beleza pristina e original de um monumento natural, tal como sempre foi. São vários os quilómetros por trilhos antigos e bem conservados que nos conduzem até lá desde Sotillo de Sanabria, o “pueblo” mais próximo, e são muitos os visitantes anónimos com que nos cruzamos e que nos saúdam com um “hola, buenas!” que nos faz sentir a cumplicidade e respeito pelo próximo, lugar-comum para quem já está habituado a estas lides da montanha.
Para quem conhece o Poço do Inferno, na nossa Serra da Estrela, torna-se inevitável a comparação. Mas por cá, o alcatrão que lhe democratizou o acesso, para além de lhe desvirtuar a beleza da inacessibilidade, tornou-se numa ferida aberta por onde chega o lixo deixado por quem nunca aprendeu a respeitar a Serra.
Em Sanabria, como na nossa Serra da Estrela, a neve não é mais que a cereja em cima do bolo, mas por cá continua-se a querer vender apenas a cereja e ignorar o resto do bolo. Apesar da neve em maior quantidade, melhor qualidade e durante maior período de tempo, não há estância de ski, apenas trilhos sinalizados para ski de travessia, sempre que as condições de neve o permitam. Sem assim implicar estradas em altitude (e consequente necessidade de manutenção), estruturas complexas e aglomerações excessivas de visitantes em zonas ambientalmente sensíveis.
A aposta num turismo de qualidade e diversificado, centrado nos valores naturais e não sazonal, resulta num verdadeiro estímulo à conservação da natureza e biodiversidade num ciclo virtuoso de procura e oferta entre visitantes e agentes locais ambientalmente conscientes, com óbvios benefícios ambientais e económicos.
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