sexta-feira, outubro 02, 2009

Ainda o concurso de ideias para a Torre

Depois de ter escrito o post sobre o concurso de ideias para a zona da Torre, saíram mais algumas notícias a esse respeito, a propósito de umas declarações proferidas pelo presidente do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB), Tito Rosa. Uma dessas notícias foi publicada pelo diário Público a 14 de Setembro e pode ser lida aqui.

Não acho má esta ideia de um concurso de ideias. Concordo que deve haver um processo de análise de propostas, que devem avaliadas por um conjunto alargado de entidades, e que a decisão deve ser transparente. Isto significa que devem ser previamente definidos (e publicitados) objectivos, linhas orientadoras, critérios de decisão, limites orçamentais e que junto com a decisão deve ser publicitada a sua justificação, feita à luz dos ditos objectivos, linhas orientadoras, critérios e limites orçamentais.

Mesmo concordando com esta ideia, tenho algumas reticências:

  • estranho as declarações do presidente do ICNB. Aquilo que ele diz, as razões que invoca para o dito concurso, reflectem uma preocupação com o ambiente na serra da Estrela e, em particular, na zona da Torre? Não será mais uma preocupação de índole turística? É que podemos ler coisas como "acolhimento de qualidade", alusões ao "estado de degradação de algumas estruturas" e diz-se que poderão ser criadas "algumas infraestruturas" (ufa, ainda mais?!). Mas, sobre ambiente, mesmo, apenas generalidades, e muito, muito poucas.
    Esta atenção que o ICNB/PNSE aparentemente dedica a questões menos estritamente ambientais vem, parece-me de longe. Foi o PNSE (ou seja, indirectamente, o ICNB) que pagou as obras que permitiram acolher a venda ambulante que se fazia na Torre no interior de alguns edifícios da antiga base militar, assim criando os centros comerciais que agora existem, foi o PNSE/ICNB que se sentiu obrigado a pagar uma ETAR para tratamento dos esgotos desses edifícios (não sei se esse tratamento já é eficaz, da última vez que soube desse assunto, continuava a correr m**** ao ar livre).
    Francamente, achava mais razoável que o Instituto de Conservação da Natureza concentrasse os recursos que dedica à serra da Estrela mais a conservar a natureza (se considerasse necessário, proibindo até algumas actividades) e menos a promover acolhimento de qualidade, comércio de qualidade, estacionamento em quantidade e mais outras coisas que, a meu ver, não lhe dizem respeito e até lhe complicam a vida.
  • esta declaração de intenção do lançamento de um concurso de ideias vem um ano depois da inauguração do Centro de Interpretação da Torre e de obras numa capela que integrava a base da força aérea. Não tinha sido mais lógico fazer o concurso de ideias antes de serem autorizadas aquelas iniciativas?
  • Diz o presidente do ICNB que "os edifícios actuais serão mantidos e requalificados e poderão ser criadas algumas infra-estrututuras". Das duas uma: ou se encontram utilizações rentáveis o suficiente para que seja vantajosa a ocupação de todos os edifícios, ou alguns deles acabarão por, mais tarde ou mais cedo, ficar ao abandono. Mas edifícios abandonados deterioram-se, degradam-se. Estamos dispostos a um novo concurso de ideias daqui a uns anos, pelas mesmas razões que agora se invocam? Estamos dispostos a um dispêndio periódico (e aposto que será sempre o PNSE a pagar, de acordo com a nossa estranha tradição) para manter edifícios que não são utilizados? Não será melhor, antes, demolir os edifícios que não se considerarem aproveitáveis?
    É a minha vez de utilizar uma palavra com que alguns leitores caracterizam o Cântaro Zangado: porquê este fundamentalismo conservacionista dos edifícios da Torre?

Continuo a achar que a melhor proposta seria a de demolir todos os edifícios da zona da Torre, transformar o acesso asfaltado até à estrada nacional num trilho (poderia até ser pavimentado, para permitir o acesso de pessoas em cadeiras de rodas, por exemplo) e colocar, no actual cruzamento com a estrada nacional, uma placa orientadora com os dizeres "Torre - 800m - 10 min". Isto sim, seria uma verdadeira requalificação, isto sim, seria um verdadeiro passo no desenvolvimento de um turismo de qualidade, isto sim, seria um verdadeiro sinal de real vontade de protecção da natureza.

Se não houvesse edifícios na Torre, não teríamos a "situação menos positiva de alguns edifícios e logradouros" a que se refere Tito Rosa. Se não houvesse edifícios na Torre, não teríamos que inventar o que fazer com eles, não teríamos encargos com a sua conservação, não teríamos lá esgotos polémicos, mas, sobretudo, não teríamos a degradante pouca vergonha que leva *todos* os apreciadores da serra da Estrela que eu conheço a dizer que evitam sempre que podem aquela zona. Que garantia é que estas declarações do presidente do ICNB dão que esta lamentável situação venha a melhorar com o que resultar deste concurso? Nenhuma.

2 comentários:

Anónimo disse...

Boa Noite,

Sem mais uma vez querer ser Advogado do Diabo, um concurso de ideia é mesmo isso – Ideias – Há que deixar fluir a criatividade, evitando castrar ou secar essa arte que existe nalguns.

Aparentemente, existe um “caderno de encargos” que irá balizar o concurso. Se esse Caderno de Encargos for profissional, julgo que parte das preocupações ficarão eliminadas, ou seja, não irá ser construído nenhum “Bilboa Guggenheim” na Torre.

Este fim-de-semana, mais uma vez, tive oportunidade de constatar o que é o interesse dos visitantes na Serra: Paisagem. Não foi necessário existir neve, nem tão pouco vendedores de queijo, mel, ou casacos de pele. Paravam simplesmente na beira da estrada para tirar uma fotografia e contemplar a paisagem. E não eram tão poucos como isso.

Mas será que tinham acesso às melhores paisagens da Serra?

Desta vez, armei-me em turista “totó” e visitei o “Posto de Turismo da Covilhã”. Curiosamente, este posto de Turismo fica fora de mão para quem visita a Serra, sendo que no seu interior não consegui obter nenhuma informação útil sobre turismo da natureza. Não fosse eu saber ao que ia e teria certamente ficado perdido. Chegado ao local pretendido – Cântaro d’Ametade – verifiquei que nenhum dos caminhos que foram referenciados para o Cântaro d’Ametade se encontrava sinalizado. Felizmente, descobri umas simpáticas pedras que lá me foram indicando o caminho.

Tendo eu já deixado os escuteiros há muitos anos, fiquei com um misto de sentimentos: Por um lado é bom recordar os tempos de aventura e de descoberta, mas por outro interrogo-me se a Serra deverá estar reservada para escuteiros ou para os tecno-aventureiros dos tempos modernos?

As leis da natureza também se aplicam ao turismo, ou seja, na ausência de algo que chame os visitantes, a beira da estrada e a torre continuará a ser uma boa visita à Serra.

Vamos a ver qual o resultado que o concurso de ideias irá ter.


Cumprimentos,

João Coxo.

PS: Sobre os edifícios no topo da torre, se visitarem este local, percebem qual a torre das bolas que está a ser utilizada e que foi recentemente reabilitada…

Anónimo disse...

Quando me referia a "Cântaro d’Ametade", na verdade queria referir-me a "Covão d’Ametade".

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!