quinta-feira, agosto 20, 2009

Picos da Europa — 3: Acessibilidades

Zona do Parque Nacional dos Picos de Europa. Clique no mapa para aceder ao maps.google, onde poderá analisar a figura em maior detalhe.

Creio que as zonas mais visitadas no interior do Parque Nacional dos Picos da Europa são a dos Lagos de Covadonga e a Ruta del Cares, entre Poncebos e Caín (assinalei no mapa Poncebos e a zona dos lagos).

Todos os dias, desde o final da Primavera até ao início do Outono, ocorre uma grande afluência de pessoas às duas zonas. Os engarrafamentos de tráfego, o estacionamento selvagem e todos os problemas deles decorrentes seriam inevitáveis, se, como são cá, de facto o fossem.

Como é que nos Picos da Europa fazem para evitar os engarrafamentos e tudo isso? Da única maneira possível: proíbem o acesso de viaturas privadas às zonas de maior afluência antes de ser atingida a sua capacidade máxima.

Quando, perto das dez da manhã, me dirigia a Poncebos no meu carro, a fim de fazer a Ruta del Cares, um funcionário do município mandou-me parar a cerca de dois quilómetros de distância do meu destino (como tinha mandado parar todos os que me antecediam) e perguntou-me onde me dirigia. Face à minha resposta, informou-me que não teria lugar para estacionar em Poncebos, pelo que não podia autorizar-me a prosseguir. Aconselhou-me antes a estacionar num grande parque ali instalado e a fazer o caminho até Poncebos a pé ou a aguardar pelo autocarro. Informou-me também que é muito mais prático deixar o carro em Arenas de Cabrales e subir desde o início no transporte público.

O mesmo acontece em Cangas de Onís (no canto superior esquerdo do mapa que ilustra este post) para o acesso aos Lagos de Covadonga. Podem subir viaturas particulares até às oito da manhã ou a partir das oito da tarde. Durante o dia, só o acesso por transporte público (autocarro) é autorizado. Três grandes parques na zona de Cangas de Onís são servidos pelo dito transporte público e nas estradas principais em redor desta localidade, placards electrónicos fornecem informação sobre a sua taxa de ocupação.

Nem túneis, nem itinerários principais alternativos, nem telecabines, nem aumento do número de acessos asfaltados, nem alargamento dos que já existem, nem grandes parques de estacionamento nas zonas a visitar. Apenas ordenamento.

Merece ser referido que todos os parques de estacionamento que mencionei se encontram no exterior do Parque Nacional.

2 comentários:

PJTM disse...

Se a Serra da Estrela fosse nas Asturias
1. Não existiria a ligação Manteigas>Torre>Lagoa Comprida
2. A ligação Manteigas>Gouveia seria de acesso restrito a veículos autorizados
3. Existiria um hotel\refúgio nas penhas douradas unicamente com acesso por taxis 4x4 ou a pé
4. Um teleférico como unico acesso à torre
5. Dezenas de trilhos e vários refúgios
6. Acesso regulado à lagoa Comprida

E estaria sempre cheia de turistas.

Existe realmente uma grande diferença no amor que os nossos irmãos Asturianos nutrem pelas suas montanhas. É de realçar no entanto que a batalha contra a ditadura do automóvel é relativamente recente.

Nos lagos de Covadonga a primeira abordagem foi a de facilitar o acesso com pelo menos três grandes zonas para estacionar, Refugio de Caçadores, Buferrara e Lago Ercina, no entanto a região constatou que o tempo de acesso cada vez maior e a paisagem desfigurada de viaturas ameaçava afastar, nas épocas de maior afluxo, o turista não ocasional, ou seja, apesar de muita gente nas estradas da montanha a hotelaria local não beneficiava em nada. A opção de regualar activamente o acesso foi encarada com cepticismo e mesmo alguma contestação, no entanto, volvido alguns anos não noto nenhuma diminuição de turistas, os hotéis estão cheios e a Sidra continua a jorrar nos bares sempre cheios. Verdadeiramente beneficiadas foram as empresas de transporte de passageiros que agora têm os autocarros sempre cheios e triplicaram as carreiras.

Poncebos é vítima do sucesso da Ruta do Cares e da mística de Bulnes. De ano para ano assisto ao engrossar de caminhantes e respectivas viaturas e somente este ano vi alguma regulação, o que felicito, julgo que ainda falta alguma publicidade às carreiras públicas vindas de Arenas, a maioria das pessoas simplesmente desconhece a alternativa.

Fuente Dé é outro grande ponto turístico, aqui o acesso ao maciço central é somente efectuado por teleférico , jipes 4x4 concessionados ou a pé. É talvez o ponto onde o turismo de ocasião é mais sentido com a esmagadora maioria dos visitantes a limitar-se a subir o teleférico e a abandonar o vale de seguida. Como solução a região aposta na qualidade da hotelaria e gastronomia para reter visitantes.

Temos muito a aprender com o exº dos Picos

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Tenho lido com particular interesse o que tens escrito sobre as Astúrias.
Não conheço os Picos da Europa, mas conheço bem o Parque Natural de Somiedo e, ainda que não tão bem, o Parque Natural de Fuentes del Narcea e a Reserva Integral Natural de Muniellos.

Como já aqui sublinhaste, bem como algumas das pessoas que aqui deixaram comentários, não se pretende dizer que em Espanha, e nas Astúrias em particular, tudo é perfeito; ou que, por oposição, nada de positivo existe na gestão do Parque Natural da Serra da Estrela.
Mas há um universo a diferenciar a nossa realidade da realidade asturiana. E, como o próprio José escreveu e muito bem, essa diferença está alicerçada na própria população local. Aliás nem poderia ter êxito de outra forma.

Em Somiedo, por exemplo, as pessoas são a favor do Parque Natural e não apenas pelo amor que têm à sua montanha e ao respectivo património natural.
As pessoas são favoráveis ao Parque porque, fruto de um desenvolvimento turístico sustentável, viram os seus rendimentos anuais aumentarem. Em vez de se fazer aldeias de montanha ao estilo nórdico, as pessoas receberam subsídios para melhorar as suas casas, no respeito pela arquitectura local, e passaram a alugá-las, parcialmente, para receber turistas.
Montaram empresas para passeios a cavalo na montanha ou passaram a escoar, com maior facilidade, muitos dos produtos artesanais que produzem.
Lembro-me do dono de um dos cafés de Valle del Lago, aldeia a 1500 m de altitude no coração de Somiedo, me dizer que aquando da criação do Parque o único pedido dos moradores foi para não asfaltar a estrada até aos lagos, como maneira de preservar a paisagem, a natureza, o sossego de que sempre tinham usufruído e o futuro com um turismo de qualidade.

E turistas não faltam ali...Mas são turistas que permanecem vários dias, que ficam para conhecer as montanhas a pé ou a cavalo, que dormem várias noites, que enchem restaurantes e bares e compram o artesanato local.
Por aqui, raro é o turista que vem apenas para dar uma volta de carro e voltar, no mesmo dia, à cidade de origem.

É preciso sublinhar que em Somiedo grande parte da população vive, directa ou indirectamente, do turismo e que este foi potenciado pela própria criação do Parque Natural. Por lá, os rendimentos não ficam concentrados em meia-dúzia de empresas e não existe nenhum monopólio turístico, como é o caso da Turistrela.

Escusado será dizer que o alcatrão se resume praticamente ao acesso às aldeias e que, daí em diante, nenhum trânsito automóvel é permitido (mesmo de jipe ou moto 4x4); escusado será dizer que não há teleféricos, chalets nórdicos ou casas em zinco; concentrações motards em áreas sensíveis; centros comerciais de gosto duvidoso; estruturas, naturais ou artificiais, para a prática de esqui ou snowboard; não há planos para casinos, campos de golfe ou aldeias do Pai Natal!

Por mais diferenças (e há bastantes!) que haja ao nível político, quer ao nível do turismo, quer ao nível da política da conservação da natureza, a verdadeira diferença está na forma como as populações locais (cá e lá) olham para a montanha.

Infelizmente, por cá as políticas erradas continuam o seu caminho porque encontram suporte na maioria da população local, que continua a achar que o melhor que se pode fazer pelo turismo da serra é mais e mais asfalto, é mais e mais betão. Deslumbrados com um pseudo-progresso que continua a encher os bolsos de meia-dúzia, incapaz de estancar a sangria de pessoas da montanha para o litoral e incapaz de estancar a progressiva deterioração da verdadeira riqueza da Estrela: a sua natureza!


Apesar de poderem até ser engenheiros, arquitectos ou doutores, quem manda na Serra da Estrela não tem metade da cultura, da visão estratégica e da inteligência que aquele senhor, dono de um café em Somiedo, tem...ele, que nos mais de 70 anos que terá em cada uma das suas pernas, de certeza absoluta que nunca terá ido à escola.

Se é para continuar a destrui-lo...por favor, deixem o gigante continuar adormecido!

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!