Tenho uma profissão exigente e compensadora, e não pretendo mudar de ramo para me dedicar ao turismo. Não tenho qualquer formação nessa área, sei de turismo tanto ou tão pouco como qualquer um. Ou melhor, sei de turismo apenas o que da minha actividade de turista aprendo. Sei de turismo apenas na perspectiva do cliente.
Por outro lado, creio que conheço relativamente bem a serra, o suficiente pelo menos para considerar (bem ou mal) que não preciso de pagar a guias ou a monitores para praticar as actividades que me interessam. Acresce ainda que, como moro na região, também não sinto falta de unidades hoteleiras ou similares para pernoitar ou para me alimentar. Tenho a minha casa para isso. Ou seja, não tenho nenhum interesse pessoal directo no desenvolvimento do turismo na serra da Estrela.
Por outro lado ainda, sou da opinião que o desenvolvimento de uma região não se pode basear no turismo. Entendo que o turismo é um ramo que pode e deve ser aproveitado, mas é importante que seja apenas um de vários sectores económicos relevantes. Isto é verdade relativamente a tudo (lá diz o ditado: não se ponham os ovos todos no mesmo cesto), mas é especialmente verdade no caso do turismo. O turismo de qualidade vive do que é verdadeiro, do que é genuíno numa região. Se a região se afunila para o turismo, deixa de ter aspectos verdadeiramente genuínos, verdadeiramente "verdadeiros". Não é um pouco isso que acontece nos grandes centros de turismo? O que há de genuíno em Quarteira, por exemplo?
Mas, se não sei nada de turismo, se não pretendo iniciar um negócio nesse ramo, se não tenho interesse pessoal e directo no desenvolvimento do turismo na serra da Estrela e se entendo que o turismo deve ser apenas um entre vários vectores para o desenvolvimento, porque diabo falo eu tanto, tanto de turismo?
Falo muito de turismo porque todos falam de turismo. Vejamos: pretende-se asfaltar mais uma estrada? Afirma-se que é para desenvolver o turismo; quer-se construir quatrocentos apartamentos nas Penhas da Saúde? É para desenvolver o turismo; deseja-se uma nova barragem? Indica-se que vai ser bom para o turismo... O turismo serve de capa a muita coisa: aos interesses imobiliários (como no Algarve), aos negócios dos construtores, aos dos políticos empenhados nas campanhas eleitorais em mostrar (ou prometer) obra, etc. Ora, se toda a gente invoca o turismo, eu também o posso fazer, porque não?
Mas quando eu falo de turismo na serra da Estrela, falo de um verdadeiro turismo de montanha, não da multiplicação de estradas, de aldeamentos, casinos, barragens e teleféricos. Falo de actividades de ar livre, de interpretação da natureza, de pedestrianismo, de turismo lento e distribuído por todo o ano, e não daquilo que nós aqui temos e que ao longo das últimas décadas temos com tanto fervor cultivado. Falo de um turismo baseado mais na prestação de serviços (pagos, evidentemente) do que na construção de infraestruturas. Quando falo de turismo na serra da Estrela, falo daquele que procuro (e encontro) nas outras montanhas que visito.
E faço-o porque esse turismo, tendo também impactos vários (e alguns graves), é mesmo assim infinitamente menos prejudicial para o ambiente e a paisagem que aprendi desde criança a apreciar (e que gostava de poder continuar a apreciar, e a partilhar com os meus filhos, e que eles o possam fazer também com os deles) do que todas estas outras actividades que, sendo apregoadas em nome do turismo, mais não fazem do que dificultar o seu desenvolvimento, ao substituirem-no por isto que temos cá pela serra da Estrela, por isto que, como disse há pouco, temos cultivado tão fervorosamente.
Falo de turismo porque entendo que há vantagens económicas a retirar do ambiente e da paisagem da serra da Estrela. Não que pretenda eu retirar essas vantagens. Eu procuro compensações de outra ordem. Mas os que apostarem num turismo a sério na serra da Estrela, tal como eu, só terão a ganhar com a preservação do seu espaço natural. E, tal como eu, só terão a perder com a continuação deste actual estado de coisas.
É por isto que falo tanto de turismo.
3 comentários:
Tudo passa por um Turismo Sustentável!
O mas nem todos têm a capacidade de o praticar, isto enquanto o lucro se sobre puser a todo o resto!
Turista ou não?, tem razão. Mas, por outro lado, se o turismo não for sustentável, não fornece um rendimento continuado. Sustentável significa que se pode manter. Insustentável significa o contrário. Logo, se queremos lucro, e se o queremos hoje e amanhã também, temos que apostar em investimentos sustentáveis em todas as suas dimensões, incluindo, é claro, a ambiental.
Mas isso obriga a olhar mais longe que o horizonte de financiamento pelo actual QREN. Obriga a pensar em *amortizar* investimentos (ou seja, a fazê-los de modo a que se possa lucrar com eles) e não apenas em gastar dinheiro só porque ele anda aí disponibilizado por decisões do governo.
Creio que o que se passa agora no turismo da serra da Estrela já se passa há muito tempo com os apoios para a agricultura: há subsídio para semear, semeia-se. Colher, talvez se colha, se houver subsídio para a colheita. Se não houver, que se lixe!
Procura-se o lucro apenas no próprio subsídio? Às vezes, é o que parece. Mas isso já não tem nada que ver com turismo, pois não?
Esquecia-me, Turista ou não?, de o felicitar pelo regresso do Covilhã Turística! Força!
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