quinta-feira, outubro 16, 2008

"A Quercus é um negócio"

A fim de ampliar a Zona Industrial do Tortosendo, o presidente da Câmara Municipal da Covilhã pretende que sejam abatidos cerca de 3000 sobreiros, alguns centenários, numa área de Reserva Agrícola Nacional e Reserva Ecológica Nacional. Este assunto tem sido noticiado em diversos blogues (ver A Sombra Verde, por exemplo) e órgãos de comunicação social regional, pelo que não me vou alongar muito nos detalhes do caso propriamente dito.

Como o sobreiro é uma espécie protegida por lei (e é-o por razões ambientais mas também por razões estritamente económicas) este abate anunciado motivou uma intervenção crítica da associação ambientalista Quercus, uma das maiores organizações não governamentais de ambiente em Portugal, senão a maior. Como podemos ler no comunicado, a Quercus pede que a lei (e não está em causa apenas a da protecção aos sobreiros) seja aplicada, ou seja, entre outras coisas, que se faça uma avaliação do impacto ambiental da medida. Deixem-me enfatizar: a Quercus pede que seja respeitada a lei. Decerto que faz o pedido por pretender a permanência dos sobreiros onde estão, é óbvio e expectável, vindo de quem vem. Pode-se concordar ou não com esta pretensão, mas não se pode negar que é uma pretensão legítima, isto é: que a Quercus tem o direito a defender a permanência dos sobreiros onde estão. E volto a repetir, o que a Quercus afirmou foi que exige que seja cumprida a lei.

A esta pretensão, o sr. Carlos Pinto (o presidente da autarquia covilhanense), no estilo trauliteiro a já que nos habituou (só para dar dois exemplos recentes, recorde-se o tom das suas declarações a propósito do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Serra da Estrela ou dos estatutos do Pólo Turístico da Serra da Estrela), respondeu (ver, por exemplo, o arquivo da Rádio Cova da Beira)

"de vez em quando vêem umas pessoas de fora, não se sabe de onde, com posições reaccionárias que é o que caracteriza essa associação",
e
"a Quercus é um negócio e por isso tem pouca credibilidade na CMC"

Eu acho esta reacção (recordo: a um pedido de respeito pela lei) despropositada. Mas mais. Como o próprio autarca dá a entender, uma ampliação da zona industrial é necessária para permitir a instalação de empresas, ou seja, negócios; os terrenos terão que ser comprados ou expropriados (negócio) aos seus proprietários, que decerto fazem negócio com a exploração da cortiça e de outros produtos agrícolas. Mas estes (e tantos outros, claro) negócios, aparentemente, não são como o da Quercus, estes negócios não são motivo para "pouca credibilidade na CMC". Estranho.

Ou será que o sr. Carlos Pinto pretende antes afirmar que a Quercus é, não um negócio como outros, mas antes uma negociata, com interesses privados obscuros, eventualmente nos limites, ou para lá dos limites, da legalidade? Se é isso, que não se fique por insinuações; que o diga claramente e que o prove, se conseguir, ou que assuma as suas responsabilidades e as penalizações eventualmente delas decorrentes se não conseguir.

Moro na Covilhã e sou sócio (muito pouco activo) da Quercus (e de outras associações, ambientalistas e não só). Não sou o único. Que o presidente da câmara me considere reaccionário não me aborrece por aí além. Mas é claro que fico ainda com menos vontade de votar nele de cada vez que se sai com tiradas deste calibre.

Agora à laia de desabafo: caramba, no PSD da Covilhã é consensual esta forma rude, arrogante e trauliteira de estar na política? Este constante "agarrem-me que eu vou-me a eles" de taberna? É a isto (e à ausência de alternativa a isto noutros partidos) que estamos reduzidos?

2 comentários:

Tiaguss disse...

Se calhar quis referir-se que não tem oportunidade de "negócio"!!!

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

José,

Tens duplamente razão. Insuportável é este estilo "trauliteiro" contra quem , talvez de forma ingénua, quer ver apenas a lei cumprida; como insuportável é o silêncio e a falta de propostas alternativas de uma certa oposição, pelo menos daquela que tem pretensões a ser poder.

Resultado? O poder eterniza-se o que, para os que acreditam na conciliação entre progresso económico e preservação ambiental, só podem ser más notícas!

Bom fim-de-semana.

Algarvear a Serra da Estrela? Não, obrigado!